sexta-feira, 30 de junho de 2006

Mas não julguem que não penso
Eu sou é uma pensadora doméstica.
Fecho-me em casa e penso muito.
Quando venho cá para fora é que começo a disfarçar.
Não quero que ninguém no meu trabalho desconfie que eu,
quando estou em casa, penso sozinha.
É proibido.
Foi uma das primeiras regras que nos obrigaram a aceitar.
Proibido pensar.
Expressamente proibido pensar, a não ser a partir dos nossos
livros.
Deram-nos 2 livros.
Um para andar para frente e outro para andar para trás.
Não adianta nada.
Eles disseram:
-- Se algum dia tiveres vontade de pensar, lê primeiro estes
dois livros e depois pensa a partir deles.
Era um método aparentemente eficaz para que ninguém
saísse do mesmo lugar, mas eu dei-lhe a volta.

Eu sou muito esperta.
(aproxima-se)

Quando estou em casa, depois de olhar para todos os lados e
confirmar que não sou vigiada, começo a pensar,
sem utilizar aqueles livros.
Começo a pensar para dentro.
Assim.
Reparem.
Vou pensar para dentro.
Assim.

É fácil.
Ora experimentem lá.
Uns segundos a pensar para dentro.
Vá lá, todos.


Isso. Muito bem.
Pensar para dentro.
É uma das minhas invenções.

Ainda não me deram nenhum prêmio porque dizem que
não conseguem ver a minha invenção.
Como é para dentro, eles não vêem.

Eu acho que isto é apenas um pretexto.
Eles não me querem é dar o prêmio.
Há muita política envolvida nisto.

Muita política.



Gonçalo M. Tavares
[adaptado para o feminino]

quarta-feira, 28 de junho de 2006

Eles me pegaram!
Fui atropelada pela propaganda

Andava eu toda faceira pela Unicamp, depois de três horas mergulhadas em Getúlio Vargas, um frio amigável, o farfalhar das árvores, a calmaria do IFCH (fim de semestre), um bicho-grilo sorridente e solitário pergunta se vai ter festa "Não sei", o passarinho canta, o cachorrinho passa, meus pensamentos devaneiam não me lembro por onde, e uma mulher exasperada e descabelada atravessa a rua e pergunta: "Ei, você! Quer brinde?". Mal tive tempo de voltar do minha viagem mental, dos passarinhos, do cachorro, do frio, da árvore, ela já estava com meus dois cartões de crédito e o meu CPF, entulhando-me as duas mãos de tranqueiras. Tudo assim: e puf. Você não paga isto, não paga aquilo, não tem taxa daquilo outro, essa história de não pagar estava interessante. E ganha duas revistas, uma bolsa, escolhe um livro, tem este, aquele, sai mais este, tudo rápido. Quando dei por mim, estavam passando meu cartão de crédito. Sim, no meio da rua. Como? Não me pergunte. A diaba da maquininha estava lá. Pensei: "Não vão conseguir! Hahahha! Meu gerente quase me matou semana passada porque o limite tinha estou...".
-- Passou!
-- Como assim, passou?
-- Ueh, passando
-- No crédito?
-- É. Assina aqui.
-- Não era pra passar, meu limite...
-- Pois é, olha que sorte, não! Se não você não ia ganhar a bolsa, a revista e...
Não ouvi mais nada. A menina agradeceu e foi embora. Nem retribui a despedida, fiquei inerte. De repente, tudo sumiu. A menina, a supervisora, o ajudante, a revista, as bolsas, as gentilezas. Não tinha mais ninguém. O frio voltou aos poucos, as árvores anunciavam o vento forte e eu continuei andando. Tentei justificar: uma assinatura eu dou para a minha mãe, a outra, bem, a outra também.
Bando de filhos da puta! Vocês me pegaram! Mas não pensem vocês que eu não vou resistir! Era porque eu não estava em casa, liguem-me por telemarketing e vão ver: não aceito nada e vão se fuder! Não quero porra de revista nenhuma. Assim não vale: no meio da rua, num dia tão lindo, num lugar tão agradável, depois de estudar, em meio a uma série de pensamentos aconchegantes, atropelar a gente com folders, revistas, bolsas, quinquilharias e conversa furada.
Saí com uma sensação de derrota e um sorriso maroto: aqui dentro, vocês não entram! Podem até levar meu dinheiro, meu cpf, meu endereço, mas meus pensamentos estão aqui e eu sei o que vocês fizeram em todos os séculos passados.
E, deixa estar, na próxima vocês não me pegam. Vou quebrar os cartões de crédito na sua frente, queimar todos os brindes, meter porrada no carro-propaganda e mandar todas as menininhas falantes para a puta que o pariu.
É assim. Aqui dentro, não!

terça-feira, 27 de junho de 2006

Como diria meu homeopata, mais uma de minhas idéias delirantes

Título: gostei. Capa: as cores são agradáveis. Foto: um menino expressivo.
Viro a caixinha. Sinopse: bem escrita e o roteiro parece interessante. Nacionalidade: espanhola. Resumo geral: vou levar.
Sabe aqueles filmes que têm tudo para gostarmos?! E que ainda seríamos capazes de apostar, sem ter visto ou ouvido falar, que a película será fascinante só de olhar para tudo aquilo lá em cima? Pois então, eis o meu caso para o filme “a língua das mariposas”. O cenário é a Espanha dos anos trinta, um pouco anterior à Guerra Civil. Trata-se da inocência perdida de um menino, Moncho, que, por meio de seu professor Don Gregório, se depara com um mundo cheio de descobertas, aconselho a assistirem. Pronto, acabei meu momento sinopse-divulgação.
A língua das mariposas, o filme explica, é uma tromba espiral desenrolada quando o inseto precisa sugar o néctar das flores. Um dia, me disseram (não, não é que as nuvens não eram de algodão) que a espiral é a representação do pensamento. E o diretor caminha bastante nesta vertente entre pensamento e liberdade. As questões suscitadas são profundamente trabalhadas como o estado de natureza, o instinto humano, os caminhos da razão, a descoberta do raciocínio; num grau maior, a República, o catolicismo, o fascismo, o anarquismo, o comunismo; e, evidentemente, as inter-relações entre estas variáveis na realidade espanhola da época. No entanto, nada que não possa ser facilmente aplicado ao nosso cotidiano e, acreditem, é isto que o faz um bom filme. Tudo muito bem articulado: a conversa do professor com os alunos durante um passeio no bosque; o enfoque na geometria espiral; os conflitos entre a mãe (católica) e o pai (republicano) de Moncho; os questionamentos sobre a morte, o amor, a verdade e “bem e mal” (no final). Por estas vias, o filme deixa várias “lições” (não no sentido moral, mas para reflexão) e, por um abalo positivo momentâneo da minha auto-estima como escritora, escolhi, aleatoriamente, uma delas para tratar aqui.
Atear-me-ei à língua do inseto – por ser o centro da narrativa, não acredito que tenha apenas esta interpretação – como uma proposta de atitude filosófica.
Para o ato de “desenrolar” a espiral, o diretor indica duas vias: sobrevivência (alimento) e prazer. Este, no caso do filme, pode ser entendido sob duas vertentes correlacionadas: o prazer “inocente” de sentir o sabor adocicado do néctar (o mestre faz referência à ação mergulhar os dedos molhados num monte de açúcar) e o prazer sexual implícito na forma ereta adquirida pela tromba e, principalmente, quando o menino “abandona” seu passeio com o professor para ver as meninas (dentre elas, sua amada) banhando-se nas águas do riacho. A linha que amarra esta atitude infantil à língua da mariposa é a flor, ou seja, o centro da representação, neste caso, da feminilidade, da fertilidade (polinização), da natureza e principal causa do “desenrolar”. Flor esta que o professor insiste a Moncho para que leve à menina, e ele o faz.
Para o ato de “enrolar” e assim tornar-se espiral, o filme explora a relação entre pensamento e liberdade. Num determinado momento, o docente enfatiza a importância do “enrolamento” para que o inseto voe e, em outro, comanda a seus alunos que “voem” para o conhecimento. E, para nós, nada mais próximo da idéia de “liberdade” do que a ação de voar. Para além desta aproximação, aparentemente, óbvia está a ação individual da mariposa em “libertar-se” da flor, trazer o pensamento (espiral) para dentro de si e “observar” a natureza sem comprometimento, arriscaria aqui, uma referência à autonomia. Como o inseto não voaria se não “enrolasse” (pensasse), a probabilidade dele ser caçado e “enjaulado” caso não o fizesse era evidente. Ou seja, se o inseto apenas desfrutasse dos prazeres e mantivesse-se ali naquele mundo restrito da flor, ele não “participaria da beleza natural” (palavras de Don Gregório); não usaria suas quatro asas (que pode ser relacionado à idéia de que não usamos nem 1/3 da nossa atividade cerebral); não teria noção da limitação do seu eixo “visual”; e seria facilmente “enjaulado” quase por vontade própria. Por outro lado, se o inseto apenas voasse, poderia até voar para muito muito longe, para um lugar aonde nem as próprias colegas mariposas chegaram, mas morreria antes de contemplar qualquer coisa, por falta de recursos de sobrevivência. Ou até mesmo, justamente por este motivo, nem chegasse tão longe assim, não teria “forças”. No entanto, antes mesmo de chegar neste limite, o inseto tenderia a voltar pela busca do prazer (também relacionado à necessidade de sobrevivência), aquilo a quem chamamos instinto.

No mais, meu instinto de escritora diz que eu já escrevi demais. Prefiro deixar a conclusão em suspense e em suspenso. Em suspense, para o debate. Em suspenso, porque ainda tenho que pensar muito sobre isto.


PS: Até onde pode ir uma adaptação? Eu li e vi “Bonequinha de Luxo” exatamente nesta ordem. Qual não foi minha surpresa quando, no filme, eles mudaram um dado, digamos, insignificante: o final. Bah! E não foi um detalhezinho do vestido que era para ser branco e virou rosa, a trama (no fim) virou ao contrário, exatamente, o oposto do final do livro. Como se, na adaptação de “Ninguém escreve ao Coronel”, chegassem as Forças Armadas num navio estrondoso, estourando champanhe, cantando o hino, clamando pelo Coronel para entregar-lhe a carta com todo o dinheiro corrigido, mais uma quantia inimaginável por indenização, uma medalha de condecoração e, de repente, o filho do ancião sairia de dentro do navio dançando a polca, dizendo que não havia sido morto “lá lá lá lá”, que era tudo armação porque seu galo tinha feito o maior sucesso no exército. Ok, empolguei-me com o final hollywoodiano do Coronel, mas, em “Bonequinha de Luxo”, foi quase isto. :D

segunda-feira, 26 de junho de 2006

Fui atingida pela febre verde-amarela
Eu juro que eu não queria falar sobre isto, mas esta hipertrofia de Copa do Mundo atingiu-me. Ó, sinto-me envenenada, principalmente nos dias de jogo do Brasil. Entro para a massa de corpo, alma, camisa do Brasil, boné, corneta, pulseira, pom-pom, xingamento do técnico june da mãe do juiz. Não, não pretendo escrever mais sobre isto. Perda de tempo. Foi só pra justificar a mudança de template.
Aproveito para (apenas) constatar o poder dos símbolos e signos sobre as pessoas.
Em meio a um debate político fervoroso na sala de trabalho, no dia da revisão finalíssima da revista, na hora do cafezinho, tirei cinco minutos para ler meu blog e esqueci-o aberto. Resultado: um amigo viu, retomou a discussão política (que já tinha sido sanada em favor do andamento da revista) e a sala voltou a ferver por mais quarenta minutos. Ora essa, por quê? Porque havia uma estrela laranja no meu blog e ele me rotulou petista.
Por uma aproximação da escala cromática ele enxergou vermelho; por uma posição política divergente que eu sempre tomo, ele chegou à esquerda; por falta de informação, excesso de publicidade e signos construídos, ele chegou ao PT.
Quanto ao conteúdo do blog, nada. Quanto à forma da estrela, tudo.

quinta-feira, 22 de junho de 2006

E o mistério continua...

"Primeiro viver, depois filosofar" Hobbes

Bilhete desta segunda. É mole?!?

terça-feira, 20 de junho de 2006

Meus heróis estão morrendo de overdose capitalista


Escrevo aqui na condição de fã, admiradora, adepta ou seja lá como queiram denominar. Não estou me abdicando de todas as “acusações” (se é que hoje em dia isto é uma acusação, se não uma “normalidade”) que serão feitas. Mas, como me considero protegida por este status, hum, café-com-leite – meus “mestres” podem muito bem se defender (poucas ou muitas vezes, acertadamente) ao apontar minha falta de conhecimento, de cultura, de experiência, de inteligência e retirar os créditos da minha crítica – aqui nada mais vai do que uma constatação, ou melhor, uma observação amadora.

Quando somos crianças, sempre elegemos alguém como ídolo. Freud explica (claro, o que ele não explica?!) e começa a lista: pai e mãe. Depois disto, somos, no meu caso (e acredito que na maioria das pessoas da minha geração), bombardeados por desenhos, programas, rostinhos bonitos, mocinha educada chamando-nos de baixinho, outra morena cantando “Jesus Cristo”, changemans, flashmans, comandos em ação e outras tranqueiras comerciais. Mas não é disso que estou falando. Quando esta fase passa (e para alguns isto leva muito tempo, quando não leva nenhum, ou seja, não passa), elegemos outros. Daí, a tendência é sermos mais críticos, pois tudo passa a se dar no campo da identificação: seja política, cultural, social, econômica. E, da eleição à militância, quando se está na faculdade, é, tecnicamente, um pulo. Mas, por motivos externos óbvios e outros internos obscuros, na minha faculdade, chegar à militância é considerado praticamente um desvio de comportamento; um erro estratégico. De qualquer forma, não cheguei à militância (ainda), mas adotei “mentores intelectuais” (que eles não se sintam encabulados) para orientar meu fluxo de pensamento; por me identificar com suas idéias, por lhes atribuir a imagem de um “porto seguro” argumentativo e outras centenas variáveis inconscientes que determinam tais escolhas.
Eis o ponto de virada: eles estão morrendo. Ou, pelo menos, alguns deles – o que já me preocupa, pois são poucos. O meu fascínio, a minha admiração começa a implodir, sim, um movimento interno de autodestruição que, dos escombros, eu ainda tento encontrar alguma peça importante para a formação de uma outra – fragmentada, híbrida e esquizofrênica – utopia de horizonte ideal. Por que isto acontece? Overdose capitalista. Estou passando a perceber cada vez mais em seus discursos, atitudes, comportamentos, colocações a influência furiosa desse universo maldito. Não, não me considero completamente alheia ao sistema, tampouco superior aos meus “ídolos”, nem esperava que eles fossem “perfeitos”, mas a dosagem é absurda! A ponto de utilizar a própria cultura e inteligência como meio único e exclusivo de ganhar dinheiro. Não há nenhuma preocupação crítica com a situação da sociedade, muito menos em mudá-la, ou em pensar sobre qualquer coisa que não tenha um fim comercial e/ou pessoal. Digamos, o ápice do utilitarismo e do exibicionismo. Este é um exemplo, eu citaria vários, como o apego inconsciente tão forte a um bem material que se tornou, quase literalmente, uma extensão física do corpo. Ou a deturpação completa de seus preceitos (que a pessoa mesmo considera) éticos e morais para alcançar uma promoção social. Para entrar na onda, eu diria que, como desperdício, é eficientíssimo.
Por outro lado, ainda bem, há os eternos enquanto duram. Aqueles que construíram uma base sólida, coerente e, façam o que fizerem, digam o que disserem, estarão sempre cada vez mais vivos na minha formação e no meu horizonte.
Enquanto isto, no lustre do castelo, descubro novos ídolos que, literalmente, já estão mortos, mas suas idéias são tão vivas quanto os mortos de overdose; e começam a esboçar alguma “anime” no meu gaveteiro mental. Bom, para os que optaram pelo caixão e a vela preta, meus pêsames. Para quem fica, aguardem-me, ainda voltarei. E para os literalmente mortos: ressuscitai-vos, por favor!

sexta-feira, 16 de junho de 2006

Mistério. Dúvidas. Filme. E algumas frivolidades...

Isto é que dá ficar sem Internet em casa, acabo escrevendo muita coisa sem postar. Resultado: acúmulo. E vou me livrar destes posts para escrever outros... aahhh...abrir um pouco de espaço para as idéias. Falando em idéias, hoje me senti a marqueteira do ano!! Fui escalada para fazer o “logo” de um grupo e, constantemente, sou convocada para frases de efeito, nomes de empresas, slogans, títulos de matéria, resenha, trabalho. Eu lá tenho cara de banco de criação?!? E a grande maioria delas nem é tão original assim. Muitas, muitas, muitíssimas vezes mesmo é uma paródia inútil, ou um trocadilho infame, nada muito custoso para o fósforo e potássio. O que mais gosto, mas dá um pouquinho mais de trabalho, são jogos semânticos, fonéticos, mistura de idiomas, enigmas lexicais, estas coisas. Só que, às vezes, tenho que explicar, daí perde aquele caráter “comercial”, entendem? Tem que ser tudo, hum, direto e reto no plim da pessoa. Droga!
Vocês notaram? É marqueteira, logo, empresas, slogans, banco, custoso, comercial... para fechar a semana senhora-capitalista tenho que informá-los que só faltou eu receber por isto, pois é, é tudo “na amizade”. Aliás, como sempre foi...
Então, espero que tenham a bondade (sim, meu ímpeto escritora-sou-eu-quem-mando-no-texto está em baixa e resolvi apelar para a boa vontade de todos) de ler os posts abaixo. Tem o mistério dos bilhetes que venho recebendo em casa, várias dúvidas – quem me ajudar a respondê-las, vou adorar! —, um filme e um pouco de firulas...
Para acompanhá-los na leitura, vou até oferecer um fundo musical (viram como estou boazinha hoje?)...

Salió a la esquina
Quien lo vio
Mi amigo desapareció
No dejo ni la sombra
El culpable sabe de que hablo yo

Desaparecido, de Orishas
O mistério dos bilhetes.

Vê se alguém entende:

Faz um mês que toda segunda-feira recebo um bilhete sob minha porta.

Primeiro:
Odatluser od ierebas, airf euqiF. Ogima ues iereS !snébarap, ohlepse oa etnerf me racoloc me ogol uosnep êcov es.
(Se você pensou logo em colocar em frente ao espelho, parabéns! Serei seu amigo. Fique fria, saberei do resultado.)

Segundo: Conformar-se é submeter-se e vencer é conformar-se, ser vencido. Vence só quem nunca consegue. Só é forte quem desanima sempre. O melhor e o mais púrpura é abdicar.

Terceiro: O domínio vence. Prossiga em não revelar sua consciência e continuará tendo-o.

Quarto: Sempre falta uma palavra, mas sempre cabe uma idéia.

Não contei, nem comentei com ninguém, é a primeira vez que falo disto. Não faço a mínima idéia de quem seja. A letra é bonita e os bilhetes são caprichosos. Passo o dia fora, não sei a que horas é colocado. Perguntei aos porteiros se alguém entra em meu nome, a resposta foi não (no entanto acrescentaram que o prédio é movimentado). Pendurei um bilhete na porta depois do terceiro, fui meio grossa, escrevi: “qual é a sua, meu?” Não sei se o misterioso leu, porque o bilhete continuava na porta mesmo depois da entrega seguinte (não sei se “sempre falta uma palavra” é a resposta da minha pergunta ou não).
Mudei há pouco tempo, não converso com nenhum vizinho, não tenho muitos contatos na cidade. Pensei na possibilidade do destinatário ser a pessoa que morava aqui antes. Fora de cogitação, o apartamento ficou vazio seis meses e era um homem, logo, não justifica o “Fique friA”.
A parte do espelho não me incomoda tanto, é meio óbvio quando as palavras estão invertidas. Pode ser um vizinho, algum dos porteiros, ou alguém que se faz de entregador de qualquer coisa (aqui não há muita apuração, é só chegar com uma maletinha e pronto, a porta é aberta). Esta última opção é a que mais parece racional e me agrada, não vejo horizonte algum em vizinhos desconhecidos e/ou porteiros que não têm o que fazer e escrevem estas coisas. Isto está me deixando intrigada. O que a Estética da abdicação tem a ver com a vitória do domínio e o cabimento da idéia? Deve ter muita coisa, mas onde esta pessoa quer chegar? Depois eu quem “bato fora da caixinha” (expressão adrianística).
Apesar da sensação de insegurança, não é que eu estou gostando da idéia?
Dúvidas

Por que sempre que eu quero ler uma coisa, preciso ler outra? Por que a não-vontade de ler uma coisa, me desperta uma fome insaciável pela outra?

Por que tenho que escrever uma coisa quando quero escrever outra? Por que a não-vontade de escrever uma coisa me desperta um infindável redemoinho de idéias pululantes para outras?

Por que quando preciso pensar sobre uma coisa, penso sobre outra? Por que o pensamento sai de um lugar e vai para o outro, sem avisar, e ainda resolve uma outra questão e não a colocada? Por que, na maioria das vezes, esse deslocamento aparentemente absurdo e desconexo, quando você se volta para a questão posta, faz sentido? Quem rastreia e conduz este caminho tão rapidamente? (Eu é quem não sou, é tão rápido que nem vejo! Quando vi, puf, já era. Lá está o alarme piscando na minha cabeça: É isso! É isso! É isso!)

Por que eu preciso falar algumas coisas, quando quero falar outras? Por que as pessoas têm disposição infinita para me ouvir sobre coisas que não quero falar? E por que, para outras, elas simplesmente dormem?

Meu priminho me perguntou: Por que eu tenho tanta vontade de perguntar?
Eu, de mãos dadas com ele, atravessando a rua, respondi: Porque você quer a resposta.
Não é que ele se contentou?
Desejo com desejo. Ué, guerreiros com guerreiros fazem zigue-zigue-zá.
« Mais malheur à l’auteur qui veut toujours instruire ! Le secrete d’ennuyer est celui de tout dire »
(Ai do autor, porém, que sempre quer instruir! O segredo de entediar é o de dizer tudo)
Voltaire

A intenção da crítica é ótima, o alvo também, mas a forma não me agradou nem um pouco. O ataque ao consumismo, à super valorização da beleza, à neurose do homem contemporâneo é muito direto. E, vejam, não é que este tipo de crítica não seja válido. O escracho dos primeiros filmes de Almodóvar é magnífico. O problema é que a forma como “Crime Ferpeito” (é FerPeito mesmo), de Alexandre de La Iglesias, abordou, as críticas acabam se encerrando em si mesmas e não há nada além daquilo. Referências e analogias óbvias, símbolos, “dicas”, “final feliz” para a feia, nada disto contribuiu, na minha opinião, para algum esquema no filme. Tudo estava dado, não deixava vestígios para um aprofundamento. Porém, justiça seja feita, a abordagem daquelas questões, sim, suscita motivo para muita reflexão. E dá muita conversa no café. Mas não gostei da forma, há filmes mais “sutis” e outros tão “escrachados” quanto este que têm uma performance e um resultado muito mais “desconfortável”.
Li no jornal que ouvir música diminui em, aproximadamente, 25% a chance de você sentir dores crônicas e entrar em depressão. Só agora eles descobriram?!? Se a questão era com os 25%, tudo bem, mas que a música tonifica a alma, isto é sabido há tempos.
Toda vez que me empolgo ouvindo música em casa, no dia seguinte, aparece um aviso novo no elevador: “SILÊNCIO. De acordo com a legislação [...] Para os demais horários, pedimos a regra do bom-senso”. Ora pois, ninguém quer ser curar. Duvido que nenhum dos moradores tenha alguma “depressãozinha”. E, ah, não ouço tãããão aaaaaalto. O problema, eu acredito, é com o vizinho debaixo. Eu fico dançando e, conseqüentemente, pulando... sozinha, claro. A poucos eu delego o direito de ver meu show particular, uma leitura coreográfica própria es-pe-ta-cu-lar... ninguém mereceu ainda. Nem o pior dos meus inimigos... se é que eu os tenho.

quarta-feira, 14 de junho de 2006

Rest your bones with me

quinta-feira, 8 de junho de 2006

“En el museo de mi escuela, hay uma de las cosas más raras que vi em mi vida: un cabrito con dos cabezas. Pero lo más raro de todo, todo, todo, todo lo que vi es un compañerito que tiene una mamá y nunca le habla. Él sale, le pasa la valija a ella, y nada más. Yo, si tendría una mamá, la usaria mucho más. Me la passaría hablándole. No sé. Hay gente que tiene todo y no lo disfruta, como ese tipo que a veces espio en la esquina del bar, que toma café y lee el diario, y nada más. Hay gente que parece como si no viviera, o no le da uso a la vida”

“No museu de minha escola, há uma das coisas mais estranhas que já vi na minha vida: um cabrito com duas cabeças. Mas o mais estranho de tudo, tudo, tudo, tudo que já vi é um coleguinha que tem uma mamãe e nunca lhe fala. Ele sai, entrega-lhe a pasta, e pronto. Eu, se tivesse uma mamãe, a usaria muito mais. Ficaria o tempo todo falando-lhe. Não sei. Há pessoas que têm tudo e não aproveitam, como esse sujeito que vejo, às vezes, na esquina do bar, que toma café e lê o jornal, e só. Há pessoas que parece que não vivem, ou que a vida não lhes é útil”.

Valentin, do filme homônimo.


PS: Como vou viajar amanhã para São Sebastião da Grama (onde raios fica isto?! Também não sei, vou visitar um primo... hehehehe... e depois vou para minha terra salve, salve) deixei estes dois posts para vocês pensarem e se divertirem um pouco.
Beijos a todos!!
Mariane: apaixonada de Valère; Dorine: dama de companhia de Mariane; Valère: apaixonado de Mariane;
[Ao saber que a mão de Mariane está prometida a Tartufo, Valère encontra-se com Mariane e Dorine na sala]

Valère: Mariane, acabam de me dar uma notícia que eu não sabia e que é, sem dúvida, muito interessante.
Mariane: Qual?
Valère: Que você vai desposar Tartufo
Mariane: É certo que meu pai pôs esse plano na cabeça
Valère: Seu pai, Mariane...
Mariane: Mudou de opinião: ele mesmo acaba de mo dizer
Valère: Como? É sério?
Mariane: Sim, é sério. Declarou-se abertamente por esse casamento.
Valère: E qual o partido que tomará diante disso, senhora?
Mariane: Não sei.
Valère: A resposta é honesta. Não sabe?
Mariane: Não
Valère: Não?
Mariane: Que é que me aconselha a fazer?
Valère: Eu lhe aconselho a aceitar esse esposo.
Mariane: Você me aconselha isso?
Valère: Sim
Mariane: De verdade?
Valère: Sem dúvida: a escolha é gloriosa e vale a pena que seja aceita.
Mariane: Pois bem, senhor! Aceito seu conselho.
Valère: Não lhe será muito difícil segui-lo, ao que parece.
Mariane: Não mais do que foi em dá-lo, acho.
Valère: Eu o dei tão-somente para lhe ser agradável, senhora.
Mariane: E eu o seguirei para agradá-lo
Dorine: Vamos ver o que sairá disso
Valère: Então, é assim que se ama? E era para me enganar quando...
Mariane: Não falemos disso, por favor. Você me disse com toda franqueza que devo aceitar aquele que me impingem como esposo: e eu declaro que pretendo fazê-lo, pois é você que me dá conselho tão salutar.
Valère: Não venha desculpar-se com as minhas intenções. Você já havia tomado sua resolução e agora lança mão de um pretexto frívolo que a justifique por faltar à palavra.
Mariane: É verdade, muito bem dito.
Valère: Sem dúvida, e o seu coração nunca nutriu por mim verdadeiro amor.
Mariane: Ai de mim! É-lhe permitido ter tal pensamento.
Valère: Sim, sim, é permitido; mas minha alma ofendida talvez se lhe antecipe em projeto semelhante e sei muito bem onde levar meus sentimentos e minha mão.
Mariane: Ah! Não duvido, e os ardores que o mérito aviva...
Valère: Meu Deus, deixemos de lado o mérito: tenho muito pouco sem dúvida, a julgar pelo caso que faz dele. Mas espero que outra terá por mim muitas atenções e bem sei quem consentirá, de bom grado, em repara minha perda.
Mariane: Não é grande a perda; e você se conformará facilmente com a troca.
Valère: Farei o possível, e pode crê-lo. Coração que nos esquece nos lança um desafio e é preciso, para esquecê-lo, usar de todos os meios: se não se conseguir, deve-se pelo menos fingir. E não se perdoa nunca a covardia de demonstrar amor a quem nos abandona.
Mariane: Sem dúvida, tal sentimento é nobre e elevado.
Valère: Muito bem; e todos devem aprová-lo. Por acaso pretenderia você que eu conservasse eternamente na alma todo meu amor, vendo-a com meus próprios olhos passar para outros braços, sem dar a outra o coração que rejeita?
Mariane: Ao contrário; quanto a mim, é isso mesmo o que desejo. Gostaria que já fosse realidade.
Valère: Deseja mesmo?
Mariane: Sim
Valère: Basta de insultos, senhora, e desta maneira vou satisfazê-la. (Dá um passo para ir embora mas volta atrás)
Mariane: Muito bem.
Valère: Lembre-se ao menos que é a senhora mesma quem me obriga a dar esse passo extremo.
Mariane: Isso mesmo.
Valère: E que o desígnio que minha alma concebe segue exatamente seu exemplo.
Mariane: Meu exemplo, está certo.
Valère: Basta: no momento preciso, você vai ser servida.
Mariane: Tanto melhor.
Valère: Está vendo, é para toda vida.
Mariane: Até que enfim.
Valère: Ah! (Vai-se e, quando chega à porta, volta-se)
Mariane: Como?
Valère: Não me chamou?
Mariane: Eu? Está sonhando.
Valère: Muito bem! Continuo meu caminho. Adeus, senhora.
Mariane: Adeus, senhor.
Dorine: Quanto a mim, acho que vocês estão perdendo a cabeça com essa extravagância. E eu os deixei discutir até agora só para ver até onde podiam chegar. Ei! Senhor Valère ( Ela vai detê-lo pelo braço, mas ele fingi resistir)
Valère: Que é que você está querendo, Dorine?
Dorine: Venha cá.
Valère: Não, não, o despeito me domina. Não me faça voltar atrás naquilo que ela desejou.
Dorine: Pare.
Valère: Não está vendo? É caso resolvido.
Dorine: Ah!
Mariane: Ele não suporta minha presença e seria muito melhor que eu fosse embora.
Dorine (deixando Valère e correndo para Mariane): E você, para onde vai?
Mariane: Largue-me!
Dorine: É preciso voltar.
Mariane: Não, não, Dorine: é inútil querer me deter.
Valère: Vejo que minha presença é um suplício para ela e, sem dúvida, será muito melhor que eu vá embora.
Dorine (deixando Mariane e correndo para Valère): Outra vez? Que o diabo o carregue se deixar você ir embora! Acabem com essa brincadeira e venham cá os dois. (puxa-os, um para o outro)
Valère: Mas quais são tuas intenções?
Mariane: Que queres fazer?
Dorine: Que façam as pazes e saiam desse embaraço. Você está louco para brigar desta maneira?
Valère: Você não ouviu de que maneira ela falou comigo?
Mariane: Você está louca, ficando zangada assim? Não acompanhaste tudo? E viste como ele me tratou?
Dorine: Tolice de ambos os lados. Ela não quer outra coisa a não ser conservar-se fiel a você, pode estar certo. Você é a única para ele: não alimenta outro desejo senão o de ser seu esposo. Garanto-o com a minha vida.
Mariane: Por que então dar-me tal conselho?
Valère: Por que me interrogar sobre assunto semelhante?
Dorine: Vocês dois estão malucos. Vamos, a mão de um e de outro. Vamos, os dois.
Valère (dando a mão a Dorine): Para que dar a mão?
Dorine: Ah! Agora a sua.
Mariane (dando também a mão): Para que tudo isso?
Dorine: Meu Deus! Depressa, aproximem-se. Vocês gostam um do outro mais do que imaginam.
Valère: Mas não faça tudo isso com dificuldade e olhe pelo menos para mim sem ódio. (Mariane volta os olhos para Valère e esboça um sorriso)
Dorine: Para dizer-lhes a verdade, os apaixonados são mesmo malucos!

“Tartufo”, de Molière.

terça-feira, 6 de junho de 2006

Veja como eu sei.

Alguém aí com certeza já deve ter esbarrado pelo comercial da enciclopédia Veja que, se não me engano, vem junto com a compra da Folha ou do Estado.
Trata-se de uma criança que, a qualquer fala dos pais, responde imediatamente com as fórmulinhas prontas de almanaque. Num primeiro momento, a propaganda é até simpática e engraçadinha. Despertaria o orgulho de qualquer pai sobre seu filho. Juro, não fiz cara feia. Mas depois me ocorreu outra coisa.
Esta atitude de rotular tudo sob a ótica estrita do que alguma coisa representa superficialmente trouxe-me sérias preocupações. Então é assim que as “nossas crianças” serão, pretensamente, “educadas”? Diante de um determinado assunto, procura-se o respectivo tópico e despeja-se sobre o seu interlocutor. Relativizar as posições? Dar-lhes a devida referência histórica? Atribuir-lhes limites? Contextualizar? Analisar os próprios tópicos em questão? Concretizar? Longe disto! Isto me lembrou várias discussões que tive (e, freqüentemente, tenho) com o pai de uma amiga minha. Conservador, aristocrata, refém de cartão de crédito, shoppings, carros, celulares, marcas. Entre nós, dissidências políticas e sociais, mais nada. Ele tinha a mesma atitude da criança – claro, não do ponto de vista da infantilidade, mas da acepção e organização dos argumentos “rotulados”. Sua maior justificativa? “Eu li na Veja”.
De volta ao comercial, passei a ter calafrios sobre o tipo de pessoa que estes almanaques (de fato: como a propaganda coloca) poderiam formar. Não vou usar minhas pedras com a revista, meus amigos já o fazem por mim, e também não é o caso. Uma voz ecoou e despertou-me rapidamente para escrever este texto: Quem te ensinou isto? “Eu aprendi na Veja”.
Disaster.

segunda-feira, 5 de junho de 2006

Não tenho recordação do último filme que me fez chorar tanto como hoje. Nenhum amor meloso, nenhuma morte trágica, nenhum desastre mundial, nenhuma cena de guerra, nenhum filho perdido, nenhuma miséria, nenhum trauma do passado, nenhum E.T de cara feia, nenhuma Auschwitz; nem navio afundando, helicóptero caindo, bomba explodindo, prédio despencando, carro atropelando, meteoro desabando, vírus se alastrando; nada de efeitos high-tech, personagens virtuais, homens voadores, mocinhas chorosas, bandidos malvados, vovózinhas bondosas, crianças-prodígio, femmes fatales e galãs charmosos; nenhuma descoberta mirabolante, nenhum monstro invencível, nenhum código indecifrável, nenhum tesouro a ser procurado, nenhum duelo fantástico, nenhum segredo revelado, nenhum objeto roubado; não tem polícia, político, FBI, Interpol, SWAT, exército, presidente dos EUA, terrorista, czar, profeta, imperador, rei, ladrão, pirata, cientista, demônio, anjo, cavaleiro, traidor; nem príncipe, nem princesa; nem duque, nem duquesa; nem barão, nem baronesa; nem camponês, nem camponesa; nem tirolês, nem tirolesa; tampouco “tico-tico lá”, dança, bunda, peito, coxa, boca, sexo, drogas e rock’n roll.
Considerando grande parte dos filmes atuais, parece que não sobrou nada, não é mesmo? Porém sobrou muita coisa – bem melhor, por sinal – e eu chorei, debulhei-me em lágrimas... se assistir de novo, volto a chorar. Como disse, não há nada, aparentemente, de super-mega-ultra tocante – em termos hollywoodianos. Um filme singelo como “Cinema Paradiso” foi até o fundo de algum lugar em mon âme que eu não sei explicar. Pode até parecer a coisa mais idiota deste mundo, mas eu me emocionei. E, para os meus caros colegas jornalistas, não sei quando, nem como, nem por quê, nem o quê, nem onde este filme exatamente me atingiu para ativar tão intensamente minhas glândulas lacrimais. Para não decepcioná-los (e a mim também), a trilha sonora é um bom caminho – depois do filme, chorei até ouvindo o “menu”.

PS1: Aluguei dois dvds para o fim de semana. Deixei o que eu julgava mais “emocionante” para depois e assisti o Paradiso durante o dia. Resultado: meu domingo inteiro foi bem aquático.

PS2: Sensibilizar-me em filme, sinceramente, é uma atitude na-da comum.

sábado, 3 de junho de 2006

-Papai, o que é Páscoa?
-Ora, Páscoa é... Bem... é uma festa religiosa!
-Igual ao Natal?
-É parecido. Só que no Natal comemora-se o nascimento de Jesus, e naPáscoa, se não me engano, comemora-se a sua ressureição.
-Ressurreição?
-É, ressurreição. Marta , vem cá !
-Sim?
-Explica pra esse garoto o que é ressurreição pra eu poder ler o meuJornal.
-Bom, meu filho, ressurreição é tornar a viver após ter morrido. Foi oQue aconteceu com Jesus, três dias depois de ter sido crucificado. EleRessuscitou e subiu aos céus. Entendeu ?
-Mais ou menos... Mamãe, Jesus era um coelho?
-O que é isso menino? Não me fale uma bobagem dessas ! Coelho! JesusCristo é o Papai do Céu ! Nem parece que esse menino foi batizado!Jorge, esse menino não pode crescer desse jeito, sem ir numa missa. Pelo menos aos domingos. Até parece que não lhe demos uma educação cristã ! Já pensou se ele solta uma besteira dessas na escola ? DeusMe perdoe ! Amanhã mesmo vou matricular esse moleque no catecismo!
-Mamãe, mas o Papai do Céu não é Deus ?
-É filho, Jesus e Deus são a mesma coisa. Você vai estudar isso noCatecismo. É a Trindade. Deus é Pai, Filho e Espírito Santo.
-O Espírito Santo também é Deus?
-É sim.
-E Minas Gerais?
-Sacrilégio !!!
-É por isso que a ilha de Trindade fica perto do Espírito Santo?
-Não é o Estado do Espírito Santo que compõe a Trindade, meu filho, éO Espírito Santo de Deus. É um negócio meio complicado, nem a mamãe
Entende direito. Mas se você perguntar no catecismo a professoraExplica tudinho!
-Bom, se Jesus não é um coelho, quem é o coelho da Páscoa ?
-Eu sei lá ! É uma tradição. É igual a Papai Noel, só que ao invés dePresente ele traz ovinhos.
-Coelho bota ovo ?
-Chega ! Deixa eu ir fazer o almoço que eu ganho mais !
- Papai, não era melhor que fosse galinha da Páscoa ?
-Era... Era melhor,sim... Ou então urubu.
-Papai, Jesus nasceu no dia 25 de dezembro, né ?
-Que dia ele morreu ?
-Isso eu sei: na Sexta-feira Santa.
-Que dia e que mês?
-(???) Sabe que eu nunca pensei nisso ? Eu só aprendi que ele morreu Na Sexta-feira Santa e ressucitou três dias depois, no Sábado deAleluia.
-Um dia depois!
-Não três dias depois.
-Então morreu na Quarta-feira.
-Não, morreu na Sexta-feira Santa... Ou terá sido na Quarta-feira deCinzas ? Ah, garoto, vê se não me confunde ! Morreu na Sexta mesmo eRessuscitou no sábado, três dias depois! Como ? Pergunte à sua Professora de catecismo!
-Papai, porque amarraram um monte de bonecos de pano lá na rua ?
-É que hoje é Sabado de Aleluia, e o pessoal vai fazer a malhação doJudas. Judas foi o apóstolo que traiu Jesus.
-O judas traiu Jesus no Sábado ?
-Claro que não ! Se Jesus morreu na Sexta !!!
-Então por que eles não malham o Judas no dia certo ?
-Ui...
-Papai, qual era o sobrenome de Jesus?
-Cristo. Jesus Cristo.
-Só ?
-Que eu saiba sim, por quê?
-Não sei não, mas tenho um palpite de que o nome dele era Jesus CristoCoelho. Só assim esse negócio de coelho da Páscoa faz sentido, nãoAcha ?
-Ai coitada!
-Coitada de quem?
-Da sua professora de catecismo!

Recebi por email.
Eu fiz catecismo e mesmo assim não explicaram nada. Aliás, catecismo te ajuda a não ter que explicar nada, só concordar. Coisa de Jesuíta...
Melhor continuar por outras vias mesmo...
Duas coisas:

1- Numa pergunta, meu professor responde: "Você é irritantemente jovem!".
Deu-me uma vontade louca de responder: "Você é tediosamente velho!".
Não falei, só refiz calmamente a minha pergunta.
Devemos respeitá-los... nem irritar, nem entendiar: se acalmar "um, dois, três, quatro..."

2- Tum, tum, tum, ocupado. Aehbilenz, zilbhenae, ealbizenh, hezniblea. Ana Clara está longe.

quinta-feira, 1 de junho de 2006

Pior do que aluno puxa-saco de professor, é professor puxa-saco de aluno. E infinitamente pior do que ambos, é ser o aluno de quem o professor puxa o saco.
>:\\Revoltante.
O trambique desce redondo
Clóvis Rossi

SÃO PAULO - Suspeito de que pouca gente tenha prestado atenção ao retrato acabado do brasileiro que está no ar nos comerciais, embutido em anúncio da cerveja Skol. Para quem não viu ou não prestou atenção, um resumo: um torcedor brasileiro vê a Argentina jogar contra o Brasil e, latinha de cerveja na mão, diz que, com a Skol, tudo desce redondo, inclusive o jogo. A partir daí, as traves ficam redondas e móveis. Sempre que a Argentina está para marcar um gol, elas saem da posição regulamentar, e o gol é perdido. É a sacramentação pública do trambique, da falta de respeito às regras, regrinhas simples, básicas. Quando se festeja a quebra de uma regra, fica implícito que todas podem ser quebradas -e usualmente o são no Brasil. É a apologia do crime, pequeno crime, mas crime, como os brasileiros praticamos diariamente ao invadir a faixa do pedestre, ao ultrapassar pela direita, ao estacionar em fila dupla, ao subornar o guarda para evitar a multa. Fico na lista de pequenos crimes para não aporrinhar o leitor com os grandes crimes que ele lê todo santo dia, não só nas páginas policiais mas também (ou principalmente) nas páginas políticas. Note o leitor que estamos falando de futebol, uma das raríssimas atividades em que o brasileiro é universalmente competitivo. Não precisa de traves móveis para ganhar da Argentina ou de quem quer que seja. Mas o espírito do malandro cretino é esse mesmo: melhor sem esforço, com ajuda da maracutaia, do que empenhar-se para fazer valer o talento natural. Note também que estamos falando de publicidade, outro ramo em que o brasileiro é com folga dos melhores do mundo. Se os melhores louvam o trambique, os medianos e os piores farão o quê? Aderir ao PCC, lógico.