(quem sabe eu não me enforco com ela?)
Depois do coito ele dorme. Eu sei que ele é uma reta de 85 graus ascendente e outra decadente, e eu uma parábola com o zênite bem largo, mas devíamos encontrar uma equação de síntese nesta história. Enquanto isto, ele dorme.
Minha diversão predileta, durante seu sono mais profundo, é aproximar-me bem perto de seus olhos, nariz rente a nariz, boca rente a boca e não fazer nada. Assim, tenho a certeza de que, por um momento, eu me entreguei para ele - inteira até a mente - agora sim, eu faria tudo que ele pedisse, até entregar todo meu coração que ele insiste em procurar pelo canal mais complicado e desejado; e o filho da puta ficou imóvel, impassível, um insensível.
É o gancho para me virar repentinamente, como quem despreza uma carne mórbida, acender o abajur de luz fraca, sentar-me na beirada da cama para procurar um foco luminoso suficiente, os pés no estrado lateral, a boca no joelho (adoro meu joelho, mas só dobrado) e um caderninho, à frente de todo meu corpo em posição fetal, ligado a mim apenas pela mão esquerda e uma caneta na mão direita. Escrevo, escrevo, risco e escrevo: palavras insensatas de um universo desnudo, tão desnudo que esquecemos como era a roupa dele.
Por um mistério feminino ainda não desvendado – ainda vestido, eu diria – eu sei que ele acordou atrás de mim, ouço até o piscar confuso e cambaleante de suas pálpebras a percorrer, depois do ajuste-controle da retina, as minhas costas. Meus cabelos, pela noite tão agitada, estavam soltos, desalinhados e perdidos dos ombros pra baixo. Ele adora minhas costas e meus cabelos. Estou certa de que daquela cena sairia um elogio, mas ele não disse nada. Olhou para o teto e perdeu-se em outro silêncio pós-coito. Uma mistura de mácula e honraria pela (pretensa) possessão de minha pessoa gerou um orgasmo subjetivo nele. Outra forma cretina deles desaparecerem e dormirem, enquanto o meu orgasmo subjetivo é sentar naquela beira da cama e escrever, escrever, escrever e escrever para, um dia, quem sabe, durante uma briga horrenda, daquelas de ofender a quinta geração da pessoa mais querida, eu jogue todas as anotações pelos ares, esfregue mesmo na cara dele, em meio a um turbilhão de xingamentos e ameaças, e o faça entender que eu o amo mais do que aquilo. Porque quando o sexo acaba, eu continuo acordada.
2 comentários:
mmmmm... não sei, clara.
O Shampoo SEDA acertou em cheio na propaganda com o título: Olha pra mim. Olha pra mim de novo.
PQ se apaixonar é fácil, díficil é apaixonar-se novamente.
O momento em que queremos nos entregar e fazer juras eternas, eles dormem, mesmo estando acordados.
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