sábado, 22 de julho de 2006

O senhor não quer MESMO ler um jornal?
Para minha alegria, a Folha estava sendo distribuída de graça pela empresa de ônibus, eu já havia comprado o Estado na banca, e assim começa a minha saga

Ana Clara, de São Paulo
Na manhã de ontem, tudo o que eu mais queria era ler os jornais ouvindo uma rádio simpática enquanto ia em direção à São Paulo a bordo de um Cometa. Qual não foi minha surpresa quando um sujeito, com seus 50 anos, senta-se ao meu lado e inicia uma longa e maçante conversa.
Para discorrer sobre tudo que o pedante abordou, teria que ser tão pedante quanto ele; portanto, vou poupá-los de tal desconforto. Só apontarei as variáveis infindáveis (e como foi longo o trajeto) que obstaram toda minha infeliz iniciativa em querer ler um jornal, ouvir uma música, curtir a viagem, a paisagem e o sol de inverno.
Mal tínhamos saído da rodoviária, o senhor já iniciou um extenso discurso sobre o funcionamento das hierarquias militares. Acho que eu tenho feições revolucionárias ou cara de "comedora de criacinha", porque, é fato, sempre algum reacionário tenta convencer-me de coisas sobre as quais, durante a conversa, eu nem me posicionei ainda.
Não havíamos nem entrado na Anhanguera, ele afirmou contundemente ser a favor da ditadura. Some-se a esta afirmação, no mínimo, uma meia hora de tentativa de convencimento e persuasão de que os "militantes" estudantis, àquela época (e hoje mais ainda), eram meros ladrões de bancos.
E, acreditem, eram constatações e comparações tão absurdas, tão desconexas que não tinha nem como discutir. Não, não, não. Para o espanto de vocês (e, principalmente, meu), eu não debati fervorosamente, não quis fazê-lo entender coisas simples -- como se explica para uma criança --; apenas, claro, afiei minhas ironias. Algumas, ou a maioria delas, para minha tristeza, ele não entendia. Mas fui exercitando o instinto para encontrar contradições e desfazer sofismos, mesmo que só eu entendesse.
Num determinado momento, cansei e, como toda mulher deve saber, liguei meu mode OFF e deixei meus olhos em stand-by (presença BiaAbramística no texto). Contudo, o assunto enveredou por outros caminhos, logo, comecei a reexercitar-me em outros temas.
O sujeito afirmava ter encontrado a solução para todos os casos policiais polêmicos do Brasil. Desde Suzane Von Richtofen até o assassinato de Daniela Perez. Sim, até isto! Para Suzane foi a existência de uma conta na suíça e de Perez um líder do PCC. Juro! E, não obstante em sua veemência e certeza sobre o conhecimento da verdade dos acontecimentos, ainda me pediu sigilo absoluto quando soube que eu era jornalista: "Olha, não vai publicar isto, viu? Estou te contando, mas fica só entre a gente".
Não pensem vocês que não questionei sobre todos os pontos discutidos por ele, claro, esta é a graça da ironia. Porém, como disse, o senhor não percebia, pois estava tão embebecido de sua pseudo capacidade persuasiva para com uma jovem jornalista que não conseguia, como diria the master philosopher teacher, juntar lé com cré. Constatado isto, apenas passei a ouvir, relevar e interpretar seus argumentos considerando formação, idade, experiência, auto-afirmação e algumas técnicas psicanalísticas (um exercício que aprendi com um professor).
Quanto a mim, já descrente da possibilidade de ler meu jornal, muito menos, de ouvir minha música e, menos ainda, de admirar a paisagem, consegui divertir-me e dar muita risada com esta situação. Teve seu preço, óbvio: cheguei até a oferecer os dois jornais, mais de uma vez, para ele ficar quieto, mas não fui feliz.

3 comentários:

Anônimo disse...

Oi Ana!

Sou eu, o Klaus, lembra? Ônibus? Empurra-empurra? Consolação? hahahaha

Parece que suas viagens são sempre atribuladas hein!

hehehe legais seus textos!

Beijos!

Ana Clara disse...

Olá, Klaus!!!
Claro que lembro de você!! Já deixei até recado no seu blog...
Obrigada mesmo!!
Afinal de contas, me ajudar na luta até à última porta do ônibus, em horário de pico, e ainda me deixar na frente da estação é muita gentileza :DD
E depois descobrir que passamos a tarde inteira no mesmo prédio... :\\\
São Paulo é grande e o mundo é pequeno ;))
Beijosss!!

Anônimo disse...

Estou em dúvida se fico com dó de você ou se me divirto com a história. De qualquer maneira, esse povo que aborda a gente pra conversar é um saco quase sempre. Claro que sempre há velhinhas boazinhas que contam histórias bacanas de quando elas era jovens (ou que pelo menos tornam-se bacanas em uma viagem longa e tediosa), mas geralmente sempre aparecem pessoas desse tipo que você mencionou no texto. O principal problema dessas pessoas não é o fato de terem idéias cabulosas, mas sim delas falarem muito e, quando não cortam suas falas, simplesmente ignoram-nas. Mas admiro sua coragem de ter falado alguma coisa. Se fosse comigo, com certeza eu ia ficar com sono, apreciar a paisagem (quem sabe com uma atividade divertida como contar as árvores) e balançar a cabeça para alimentar a vontade de convencimento de meu querido colega de banco.
Bjo.