quinta-feira, 9 de março de 2006

Getúlio no dia de Dom Pedro

Sete de setembro. Cheguei num carro de campanha política, todo adesivado, com “40” e “Hamilton” para todo lado. A casa ficava em cima de uma montanha e, quando apontei no estacionamento, o senhor já me esperava na porta. Silvio Lazarini, 85 anos, de família tradicional italiana e figura ilustre na cidade de Pedreira. O motorista já me avisa: “Este senhor é o orgulho da nossa cidade. Fez muita história aqui em Pedreira”.
A casa era antiga, mas muito bem conservada. Ele sentou na ponta de uma mesa enorme, na entrada da sala principal, e eu sentei ao lado.
“Eu falo, depois você anota”.
Dia 26 de agosto de 1954, Getúlio Vargas se suicidou. “É o que dizem. Não dava pra confiar muito”, afirmou Lazarini. “Estava capinando a roça. Agosto é mês de seca e eu mexia com esterco, estava preparando para depois umedecer e vender. Minha mãe, já falecida, veio lá de dentro e me avisou ‘o presidente morreu’. Fui lá, ouvi o rádio e depois voltei pra roça. A vida continuava.”.
Sr. Silvio acompanhou o noticiário pelo rádio. “Tinha TV naquela época? Bom, eu não tinha. Eu fui ter a primeira em 69”, afirma. Lazarini levantou foi até uma outra sala, depois voltou e disse: “Eu acho que Getúlio era um bom presidente. Ele foi ditador por muito tempo, mas depois teve voto direto e foi eleito. Isto é sinal de que ele era bom pro povo. O povo votou nele porque gostava dele”.
Silvio Lazarini foi eleito vereador em Pedreira por três vezes, entre 1968-1972, 1984-1990 e 1990-1994. “Quem era pra assumir era Jango...o Goulart, mas ele tava no estrangeiro. Naquela época, o vice era eleito separado do presidente. E ele não era da mesma chapa. Daí colocou o (...) não lembro quem veio depois, não sei se era presidente da Câmara, do Senado, era alguém de autoridade. Depois fizeram aquele governo (...) Como é o nome mesmo?”. Sr. Silvio olha para minhas anotações e fica pensativo. Depois de um tempo, dirige-se a mim: “ Tem presidencialismo...”, eu ajudo: “Parlamentarismo?!?”. “Isto, isto. Puseram isto lá. Não sei se tava certo ou errado, porque a gente era muito distante. Eu ouvia o rádio e acompanhava as notícias. Não mudou minha rotina. O que eu senti? Decepção. Era um bom presidente”.
Onze horas. De onde estávamos, dava para ouvir as comemorações do dia da Independência que passavam na televisão. Na cozinha ao lado, sua mulher já estava terminando o almoço.
O senhor declara: “Antigamente, a gente tinha muito mais civismo. O povo ia pra rua, hasteava a bandeira, cantava o hino. Hoje, nem isto. Tenho uma coisa para lhe mostrar”. Ele se levanta, vai até a mesma sala que se dirigiu anteriormente, volta com uma enorme pasta preta na mão, põe na mesa e fala para eu ler. Era uma pasta nova, com plástico e, dentro, havia diversas partituras. Começo a folhear e me deparo com a canção do imigrante italiano. Lazarini, orgulhoso, termina a entrevista: “Noi siam partiti da i nostri paesi. Noi siam partiti co i nostri onori (...) merica, merica, merica...”.

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