Contrações
Chegou o momento em que é possível sentir tudo de todas as maneiras, viver tudo de todos os lados e ser a mesma coisa de todos os modos possíveis ao mesmo tempo: rachei. De um revertério compulsivo nas minhas entranhas, nasceu incontrolavelmente várias pessoas dilaceradas em pedaços espalhados pela minha alma. Não há temor, nem razão, só o grito da necessidade. Não dessas inventadas por aí, mas daquelas que saem lá do fundo, exatamente onde toda mulher se descobre mulher... e mãe: o útero.
Por um critério nada rigoroso, decidi contar que o nascimento se deu via uterina. Apenas para criar um paralelo biológico de uma implosão da alma, assim atribuo um caráter racional para este monte de micro-corpos que começam a ganhar vida própria, como se estivessem numa incubadora ou, num plano mais interior, criando raízes férteis em solo estéril. Nada a ver com o que realmente aconteceu, visto que muitos vestígios neurais, viscerais e racionais também foram encontrados no último corpo delito que meu super ego fez (detesto quando ele faz isto) em meu interior.
De qualquer forma, este aglomerado de pedaços de carne humana – espalhado pelo mármore frio e gelado do meu próprio eu – começa a borbulhar e a sacolejar intermitentemente deixando meu outro eu (sim, tenho vários) horrorizado. Este último eu, o apavorado, é o eu que todos acham que eu sou.
E como quem levanta de um sono profundo ou de um eterno esperar-desabrochar aquele monte de coisa amórfica começou a tomar forma – e forma de coisa.
Enquanto o eu – este aqui que vocês conhecem – vendo tudo isto, resolveu dar uma volta, fumar um cigarro, arejar as entranhas e calcular o ponto de fuga mais próximo, uma criança foi deixada no mármore frio e gélido cheio de pedaços pululantes de vida e energia. É ela quem vê tudo, com o medo numa mão e a curiosidade na outra. Estas novas coisas que – sabe a criança – tornar-se-ão pessoas rastejam-se, por enquanto, pela vil e cruel solidez de minhas edificações; e a infante assiste a tudo impassível.
Chegou o momento em que é possível sentir tudo de todas as maneiras, viver tudo de todos os lados e ser a mesma coisa de todos os modos possíveis ao mesmo tempo: rachei. De um revertério compulsivo nas minhas entranhas, nasceu incontrolavelmente várias pessoas dilaceradas em pedaços espalhados pela minha alma. Não há temor, nem razão, só o grito da necessidade. Não dessas inventadas por aí, mas daquelas que saem lá do fundo, exatamente onde toda mulher se descobre mulher... e mãe: o útero.
Por um critério nada rigoroso, decidi contar que o nascimento se deu via uterina. Apenas para criar um paralelo biológico de uma implosão da alma, assim atribuo um caráter racional para este monte de micro-corpos que começam a ganhar vida própria, como se estivessem numa incubadora ou, num plano mais interior, criando raízes férteis em solo estéril. Nada a ver com o que realmente aconteceu, visto que muitos vestígios neurais, viscerais e racionais também foram encontrados no último corpo delito que meu super ego fez (detesto quando ele faz isto) em meu interior.
De qualquer forma, este aglomerado de pedaços de carne humana – espalhado pelo mármore frio e gelado do meu próprio eu – começa a borbulhar e a sacolejar intermitentemente deixando meu outro eu (sim, tenho vários) horrorizado. Este último eu, o apavorado, é o eu que todos acham que eu sou.
E como quem levanta de um sono profundo ou de um eterno esperar-desabrochar aquele monte de coisa amórfica começou a tomar forma – e forma de coisa.
Enquanto o eu – este aqui que vocês conhecem – vendo tudo isto, resolveu dar uma volta, fumar um cigarro, arejar as entranhas e calcular o ponto de fuga mais próximo, uma criança foi deixada no mármore frio e gélido cheio de pedaços pululantes de vida e energia. É ela quem vê tudo, com o medo numa mão e a curiosidade na outra. Estas novas coisas que – sabe a criança – tornar-se-ão pessoas rastejam-se, por enquanto, pela vil e cruel solidez de minhas edificações; e a infante assiste a tudo impassível.
Até que algum eu (ou a própria criança) não lhe atribuam nomes, estes embriões sofrerão todos os espasmos que algo sem vida e, por assim dizer, sem necessidade de piedade, pode sofrer e a minha imaginação é capaz de criar.
É assim, como toda dor do parto; e, como todo fruto do mesmo, as pessoas, se nascerem, terão seus cordões arrancados impiedosa e violentamente. De modo que adquirirão autonomia, vida própria e plena liberdade, sem vínculo algum com aquela que a gerou. Isto é perfeitamente possível, pois é uma liberdade e autonomia dignas das coisas que, apesar de existirem, não existem.
Por enquanto são coisas. E, por serem, já existem. Já têm verbo, faltam-lhes os nomes. Assim sendo, não existem. Se nomeadas, serão pessoas, voltam a existir, mas não serão necessariamente eus, deixando de novamente.
Por enquanto são coisas. E, por serem, já existem. Já têm verbo, faltam-lhes os nomes. Assim sendo, não existem. Se nomeadas, serão pessoas, voltam a existir, mas não serão necessariamente eus, deixando de novamente.